Segunda-feira 1 de maio de 2018 | Presidente Prudente/SP

Justiça criminal condena Valéria Dammous e Libânia; Diamante é absolvido

Reinaldo Ruas

Em 20/10/2008 às 19:19

A Justiça condenou as advogadas Valéria Dammous e Libânia Catarina por integrarem a facção criminosa que age dentro e fora dos presídios. Cinco condenados terão de reparar o Estado em R$ 27 milhões por presídios depredados por motins. O advogado prudentino Eduardo Diamante foi absolvido das mesmas acusações. Cabe recurso.

A sentença é do juiz da capital José Roberto Cabral Longaretti. Data do dia 17 de outubro e ainda será publicada no Diário Oficial da Justiça. O mandado de soltura já foi expedido para libertar Eduardo Diamante. “Após a degradação pública, felizmente adveio sentença absolutória”, comentou o advogado de Diamante, Emir Ferreira.

Diamante foi preso em Prudente em 28 de junho de 2006, junto com as advogadas Valéria Dammous e Libânia Catarina Fernandes Costa. Todos eram acusados de ligação com a facção criminosa.

Diamante chegou a ser ouvido pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Tráfico de Armas da Câmara dos Deputados, em 12 de julho de 2006. 

As advogadas Valéria Dammous e Libânia Catarina foram condenadas a
dez meses de detenção pelos motins de presos, dez meses de detenção e duzentos e trinta dias-multa pelos danos qualificados e três anos de reclusão pelos cárceres privados qualificados. 

Cláudio Rolim de Carvalho foi condenado a um ano de detenção pelos motins de presos, um ano de detenção e duzentos e setenta e seis dias-multa pelos danos qualificados e quatro anos de reclusão pelos cárceres privados qualificados. 

Anderson de Jesus Parro teve condenação a um ano e dois meses de detenção pelos motins de presos, um ano e dois meses de detenção e trezentos e vinte e dois dias-multa pelos danos qualificados e quatro anos, sete meses e vinte e nove dias de reclusão pelos cárceres privados qualificados. 

Orlando Motta Júnior recebeu um ano, quatro meses e dezenove dias de detenção pelos motins de presos, um ano, quatro meses e dezenove dias de detenção e trezentos e quarenta e cinco dias-multa pelos danos qualificados e cinco anos, seis meses e dezenove dias de reclusão pelos cárceres privados qualificados. 

Valéria e Libânia encontram-se em prisão domiciliar e o juiz facultou eventual recurso nessa condição. Cláudio, Anderson e Orlando já estão presos por outros crimes. 

Pelos danos ocorridos nas unidades prisionais que a quadrilha agiu para deflagrar motins, a Justiça impôs reparação ao Estado de R$ 27.480.118,71, valor que deve ser corrigido monetariamente desde o dia do fato até efetivo pagamento pelos índices oficiais do Tribunal de Justiça de São Paulo, e que será suportado, em partes iguais, por cada um dos condenados. 

Leia o inteiro teor da sentença

VISTOS
 

VALÉRIA DAMMOUS, LIBÂNIA CATARINA FERNANDES COSTA, EDUARDO DIAMANTE, ORLANDO MOTA JÚNIOR, conhecido como “Macarrão”, CLÁUDIO ROLIM DE CARVALHO, conhecido como “Polaco” e ANDERSON DE JESUS PARRO, conhecido como “Moringa”, os três últimos presos integrantes da cúpula da facção criminosa denominada Primeiro Comando da Capital - PCC, qualificados nos autos, foram denunciados como incursos no artigo 288, parágrafo único (quadrilha armada); artigo 354 (motim de presos), vinte vezes; artigo 163, inciso III (dano ao patrimônio público do Estado), três vezes, e artigo 148, parágrafo 2º (cárcere privado qualificado), vinte vezes, c.c. o artigo 69, todos do Código Penal, porque, no período compreendido entre dia incerto no mês de maio de 2006 e 28 de junho de 2006, em operações concatenadas, envolvendo várias cidades do Estado de São Paulo, entre elas São Paulo – Capital, Santos, Presidente Prudente, Presidente Venceslau, Itirapina, Mirandópolis, Getulina e Junqueirópolis, com unidade de propósitos, todos voltados para um fim comum, juntamente com outras pessoas ainda não identificadas, associaram-se em quadrilha para o fim de cometerem crimes diversos, tais como o de tráfico ilícito de entorpecentes, extorsões, seqüestros, cárceres privados, homicídios, motins, dano ao patrimônio público, entre outros, utilizando-se, para tanto, de armas de fogo. 

Consta da denúncia que, em nome da facção criminosa “PCC”, os advogados Valéria, Libânia e Eduardo deixaram a atividade profissional de defesa de garantia de seus clientes, ligados a facção criminosa, e passaram a servir como elo entre seus diversos integrantes, na distribuição de ordens dentro e fora dos presídios. Transformaram-se em importante figuras da organização, já que, com as dificuldade encontradas para a comunicação por celulares ou visitas – que estavam suspensas -, viabilizaram: a) transmissão de ordens, travestidos de advogados; b) organização de motins, atuantes como forma de pressionar as autoridades pública responsáveis pela gestão penitenciária; e c) entrada de celulares, corrompendo funcionários das penitenciárias. 

                       A peça inicial acusatória ainda destacou, dentre as diversas atividades criminosas praticadas pelos acusados: 

                       No dia 05 de junho de 2006, a ré Valéria, valendo-se de sua prerrogativa de Advogada, entrevistou-se com o co-réu Orlando, no parlatório da Penitenciária II de Presidente Venceslau (Penitenciária Maurício Henrique Guimarães Pereira), e recebeu dele a determinação de “virar duas cadeias” na região oeste paulista, dentre elas os presídios de Flórida Paulista e Lavínia, mensagem a ser transmitida a co-acusado Anderson. Na mesma ocasião, a advogada prestou relatório pormenorizado sobre a situação dos presídios na região, recebendo recados a serem transmitidos a outros integrantes do PCC. Por fim, no encerramento do diálogo criminoso, Valéria recomendou ao detento a destruição de penitenciárias federais em construção, recebendo a informação de que essa ordem já havia sido determinada pela liderança da facção. 

                       Dessa forma, um dia após o recebimento da determinação de repassar a ordem de “virar” os estabelecimentos prisionais emanada de Orlando, Valéria dirigiu-se à Penitenciária de Getulina e entrevistou-se com o detento Anderson. A determinação foi então transmitida, tendo como efeito, em 07 de junho de 2006, a deflagração de motins em 17 estabelecimentos prisionais (Paraguaçu Paulista, Martinópolis, Dracena, Presidente Bernardes, Penitenciárias I e II de Mirandópolis, Penintenciárias I, II e III de Lavinia, Riolândia, Flórida Paulista, CDP de São José do Rio Preto, CDP de Caiuá, Lucélia, Assis e Junqueirópolis). Nesta ocasião, os presos, em razão das ordens veiculadas pela liderança do “PCC” e da advogada, causaram perturbação da ordem e da disciplina dos presídios, recusando-se ao comparecimento em audiências e ao atendimento de oficiais de justiça e agentes que compareceram para a movimentação processual correspondente, agindo com o propósito bem determinado, segundo as ordens retransmitidas de obtenção de benefícios aos detentos que se encontravam na Penitenciária II de Presidente Venceslau. 

                       No dia 26 de junho de 2006, a acusada Valéria novamente entrevistou-se como detento Anderson, ocasião na qual recebeu do mesmo a ordem de mandar matar cinco agentes penitenciários. A determinação, segundo Anderson, deveria ser transmitida ao sentenciado conhecido por “Magrelo”, no presídio de Flórida Paulista. A ordem não foi cumprida. 

                       A co-ré Libânia, por sua vez, agindo com o mesmo propósito de sua colega, valendo-se da prerrogativa de Advogada, no dia 14 de junho de 2006, junto ao parlatório da Penitenciária II de Presidente Venceslau, entrevistou-se com o detento Orlando, tendo ficado estipulado que a advogada seria o elo entre ele e o líder da organização criminosa, Marcos Willians Herbas Camacho, vulgo “Marcola”, mencionado na conversa como “Playboy” ou “Barba”. Este contato deveria ser realizado por meio de entrevista da advogada com o detento Luiz Henrique Fernandes, conhecido por “LH”, que cumpre pena em cela próxima a “Marcola”, na Penitenciária de Presidente Bernardes. Na ocasião, Libânia recebeu a determinação de “fazer quebrar” e “colocar no chão” as penitenciárias de Araraquara e Itirapina II. Esta ordem foi prontamente repassada por telefone celular ao detento Cláudio, recolhido na Penitenciária de Junqueirópolis. 

                       Os fatos que se seguiram à comunicação de Libânia foram devastadores. As ordens repassadas por ela foram integralmente cumpridas nos presídios de Araraquara e Itirapina II. Como conseqüência direta da determinação, a rebelião se estendeu à penitenciária de Mirandópolis, fato absolutamente previsto pela advogada, que, assim, assumiu o risco de produzi-lo. Os presos recolhidos naqueles três estabelecimentos entraram em motim nos dias 16 e 17 de junho de 2006, perturbando a ordem e a disciplina da prisão, dando cumprimento integral à determinação da cúpula do “PCC”. 

                       As rés Valéria e Libânia, agindo com o propósito específico de retransmitir as ordens da facção criminosa, deram ensejo à perda parcial do patrimônio público do Estado de São Paulo, permitindo que presos do Primeiro Comando da Capital destruíssem as dependências daqueles presídios. Os danos na Penitenciária de Mirandópolis foram estimados em R$ 6.722.249,04; na Penitenciária de Araraquara, os danos resultaram no comprometimento da estrutura de segurança do presídio e foram estimados em R$ 13.125.000,00; e na Penitenciária de Itirapina os danos somaram R$ 7.632.869,67. Consta, ainda, que, também em razão direta das ordens emanadas de Libânia, os presos amotinados naquelas três penitenciárias privaram agentes penitenciárias de suas liberdades, mantendo-os deliberadamente em cárcere privado. 

                       Na Penitenciária de Mirandópolis foram tomados como reféns seis agente penitenciários, as vítimas Aparecido Roque da Silva, Frederico Giometti Filho, Paulo César dos Santos, Ricardo José Salton, Valdir Fonseca da Silva e Wilson Lima de Lacerda, mantidos privados de suas liberdades das 13:30 às 21:15 horas do dia 16 de junho de 2006, quando os presos foram dominados por ação policial. Na Penitenciária de Araraquara, foram feitos reféns dez agentes penitenciários, as vítimas Odair José Manzine, Antonio Fachinetti, Paulo César Marin Júnior, Dorival Mendes, Egbert Willians Cererri, Joaquim Pereira Gomes, Wilson Shizuo Takaki, Pedro Álvaro Accarini, Dário Rezendo Lima e Valmir Marani, e, também o médico Ubirajara das Neves Gonçalves Júnior, as vítimas só recuperaram a liberdade às 7h15 de dia 17 de junho de 2006, com a intervenção da Tropa de Choque da Polícia Militar do Estado de São Paulo. Por fim, na Penitenciária de Itirapina, também em razão dos motins desencadeados, foram feitos reféns três agentes penitenciários, as vítimas José Edvaldo Oseli, Carlos Develis Andrade e Antonio Carlos de Souza, privados da liberdade desde as 14:10 do dia 16 de junho até a manhã de 17 de junho de 2006, por volta de 11:00 horas, também em razão de ação da Policia Militar. Devido a maus-tratos, levados a efeito por centenas de presidiários, as vítimas, nos três presídios, suportaram grave sofrimento físico e moral. Muitas delas foram submetidas a queimaduras com pontas de cigarro, ameaças de morte e lesões corporais em regiões nobres e visíveis. 

                       Não bastasse isso, na mesma oportunidade, Libânia combinou com Orlando o acionamento do réu Eduardo, a quem encarregaria fazer entrar na Penitenciária II de Presidente Venceslau a quantia de R$ 15.000,00 em espécie e 03 aparelhos de telefonia celular, pré-pagos, com baterias e carregadores, da operadora Claro. 

                       Assim, em 21 de junho de 2006, na Penitenciária II de Presidente Venceslau, Eduardo, valendo-se do concurso de agentes penitenciários não identificados, deu integral cumprimento à ordem emanada da facção criminosa, recebida por meio de sua colega Libânia e, a pretexto de entrevistar-se com o detento Orlando, fez chegar no interior do presídio, à disposição dos criminosos ali recolhidos, os equipamentos de telefonia celular, preponderantes e eficientes para a atuação da quadrilha. 

                       Com a segregação física das principais lideranças do “PCC” na região oeste do Estado, Eduardo apresentou-se em entrevista com Orlando disponibilizando-se e aceitando o encargo de confiança para tornar-se um dos principais pombos-correios da facção criminosa em função da facilidade que a proximidade de seu escritório, em Presidente Prudente, proporcionava. Assim agindo, Eduardo não só desvirtuou-se dos ideais de sua honrosa profissão, como também ensejou mobilidade impar às ações criminosas de seus asseclas, dando celeridade e segurança na retransmissão de ordens criminosas, chegando ao ponto de, inclusive, preparar levantamento e estudos aptos a dar sobrevida ao “PCC”. 

                       Os três advogados, bem articulados dentro da organização criminosa, desvirtuaram a relação profissional que deve nortear o exercício da advocacia para manter contato pessoal com os principais líderes do Primeiro Comando da Capital. Transmitiram ordens constantes das lideranças da facção a outros presos que possibilitaram atos de violência e destruição. Apurou-se, por derradeiro, que as ações dos três advogados acusados eram compartimentadas de tal forma a que, dentro da facção criminosa, houvesse divisão de tarefas, porém sem excluir a participação deles em todos os crimes praticados, de que estavam cientes juntamente com os detentos envolvidos nas ordens de destruição de presídios, motins, cárcere privado e outros delitos variados. 

                       A denúncia foi recebida em 06 de julho de 2006, quando foi decretada a prisão preventiva dos acusados (fls. 699/702). 

                       Os réus foram citados e interrogados a fls. 877/934. 

                       A prova oral foi produzida a fls. 2536/2561, 2685/2689, 2718/2724, 2811/2813, 2972 e 2977/2978, fls. 3073/3077, 3099/3105, 3134, 3174 e 3180. 

                       Nas alegações finais, o Ministério Público requereu, preliminarmente, a conversão do julgamento em diligência para a juntada das certidões de antecedentes dos acusados e, no mérito, a condenação deles nos termos da denúncia. 

                       As defesas, por sua vez, pleitearam, no mérito, insuficiência probatória, atipicidade da conduta e não restar demonstrada a participação dos acusados como razões de absolvição. Foram argüidas, em preliminar, diversas nulidades, aqui especificadas: ausência do acusado nas audiências, configurando cerceamento de defesa, pela defesa do réu Anderson; impedimento dos Promotores, uso de prova ilícita (no tocante às escutas ambientais nos parlatórios) e falta de intimação para inquirição da testemunha José Victor Cunha, pela ré Valéria; ilegalidade da busca e apreensão e da escuta ambiental, inépcia da denúncia, impedimento do Ministério Público na investigação e cerceamento de defesa (ausência do réu em audiências), pela defesa do acusado Eduardo; inépcia da denúncia, ilegalidade da interceptação ambiental e prova ilícita da interceptação telefônica, pela co-ré Libânia; e nulidade do interrogatório por videoconferência, pela defesa do réu Orlando. 

                       É O RELATÓRIO

                       D E C I D O 

                       Desde logo determino seja realizado o ordenamento dos autos, uma vez que há folhas fora de ordem, procedendo-se a respectiva renumeração. 

                       A ação penal é parcialmente procedente. 

                       Concluída a instrução, não posso deixar de registrar que restou plenamente caracterizado aquilo que consignei em meu despacho de fls. 2696/2699: inexiste fato concreto a justificar o processamento do feito neste Juízo, uma vez que o critério básico de fixação de competência criminal, inserto no artigo 70 do Código de Processo Penal, foi totalmente ignorado. 

                       Não vislumbro razão objetiva a justificar que os procedimentos cautelares tenham sido requeridos e deferidos pelo DIPO, considerando o local das diligências, com o conseqüente entendimento de que eles vinculariam o Juízo desta Comarca, uma vez que a regra do artigo 72 do mesmo Codex tem caráter subsidiário. 

                       In casu, o lugar das infrações consta expressamente indicado na inicial, não tendo nenhuma delas ocorrido sequer próximo desta Comarca, pois a indicação de que as “operações concatenadas, envolvendo várias cidades do Estado de São Paulo, entre elas São Paulo-Capital” (fls. 01-d) não encontrava amparo naquilo que constava dos autos, no tocante a esta Comarca, já ando do oferecimento da denúncia. 

                       Exatamente por isso, assim que me promovi para este Juízo e tive a oportunidade de examinar detalhadamente o volumoso processo, entendi de remetê-lo ao local de onde teriam partido as determinações (denominadas “salves”) que desencadearam todos os fatos subseqüentes. 

                       Porém, como a Câmara Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo julgou que houve prorrogação da competência, trata-se de matéria decidida, nada mais havendo a analisar. 

                       Abordo, então, as preliminares argüidas pelos defensores nas alegações finais. 

                       Quanto ao cerceamento de defesa alegado por Anderson e Eduardo, tem-se que o mero fato de os réus não estarem presentes em todas as audiências, a maioria realizada por carta precatória, não lhes ocasionou prejuízo algum, isso porque, apesar disso, sempre foram representados e assistidos por seus defensores, que foram previamente intimados, para que pudessem entrar em contato com os acusados e, assim, fazer uso de todas as prerrogativas necessárias para as suas defesas plenas. Portanto, a presença física dos acusados é plenamente dispensável, até mesmo porque, dada a dinâmica dos fatos sob exame, eles não seriam passíveis de eventual reconhecimento por ninguém. Quem conhecia os réus não necessitaria de sua presença para prestar qualquer informe. Quem não os conhecia, nada poderia indicar, concretamente, em termos de autoria. 

                       Assim prescreve o Código de Processo Penal, “Art. 563.  Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa”.  

                       Vale lembrar que, caso a testemunha assim deseje, o réu deve ser retirado da sala de audiência, a teor do artigo 217 do Código de Processo Penal, não configurando nulidade alguma a não presença dele ao ato. 

                       No tocante ao impedimento dos Promotores de Justiça subscritores da denúncia, sua participação na investigação criminal que determinou a formação da lide penal não possui o condão de impedi-los de pessoalmente se encontrarem em dois planos: o de ensejadores da investigação e o de subscritores da peça inicial do processo-crime. Não há dispositivo legal que impeça essa participação. 

                       A atividade do Promotor de Justiça é intrínseca à investigação, pois são os fatos apurados na fase inquisitorial que embasarão a denúncia que dará início à ação penal. Portanto, eles possuem especial interesse em determinadas ações penais, como a presente, que trata de fatos de extrema gravidade. 

                        Ademais, a jurisprudência está consolidada a esse respeito, “RESP - PENAL E PROCESSO PENAL - PODER INVESTIGATIVO DO MINISTÉRIO PÚBLICO - PROVAS ILÍCITAS - INOCORRÊNCIA - TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL - IMPOSSIBILIDADE. A questão acerca da possibilidade do Ministério Público desenvolver atividade investigatória objetivando colher elementos de prova que subsidiem a instauração de futura ação penal, é tema incontroverso perante esta eg. Turma. Como se sabe, a Constituição Federal, em seu art. 129, I, atribui, privativamente, ao Ministério Público promover a ação penal pública. Essa atividade depende, para o seu efetivo exercício, da colheita de elementos que demonstrem a certeza da existência do crime e indícios de que o denunciado é o seu autor. Entender-se que a investigação desses fatos é atribuição exclusiva da polícia judiciária, seria incorrer-se em impropriedade, já que o titular da Ação é o Órgão Ministerial. Cabe, portanto, a este, o exame da necessidade ou não de novas colheitas de provas, uma vez que, tratando-se o inquérito de peça meramente informativa, pode o MP entendê-la dispensável na medida em que detenha informações suficientes para a propositura da ação penal. Ora, se o inquérito é dispensável, e assim o diz expressamente o art. 39, § 5º, do CPP, e se o Ministério Público pode denunciar com base apenas nos elementos que tem, nada há que imponha a exclusividade às polícias para investigar os fatos criminosos sujeitos à ação penal pública. A Lei Complementar n.º 75/90, em seu art. 8º, inciso IV, diz competir ao Ministério Público, para o exercício das suas atribuições institucionais, "realizar inspeções e diligências investigatórias". Compete-lhe, ainda, notificar testemunhas (inciso I), requisitar informações, exames, perícias e documentos às autoridades da Administração Pública direta e indireta (inciso II) e requisitar informações e documentos a entidades privadas (inciso IV). Recurso provido para determinar o regular andamento da ação penal. Decisão: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, em conhecer do recurso e lhe dar provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Votaram com o Sr. Ministro Relator os Srs. Ministros LAURITA VAZ, JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, FELIX FISCHER e GILSON DIPP” (Acórdão RESP 331903/DF; RECURSO ESPECIAL. 2001/0084450-3. Fonte DJ DATA:01/07/2004 PG:00248. Relator Min. JORGE SCARTEZZINI (1113). Data da Decisão: 25/05/2004. Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA). 

                        HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES (art. 12 da Lei 6.368/76) e ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO (art. 14 da Lei 6.368/76). INVESTIGAÇÃO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DOUTRINA. DECISÃO DA CÂMARA: À UNANIMIDADE, DENEGARAM A ORDEM. (Habeas Corpus Nº 70009016015, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio de Oliveira Canosa, Julgado em 19/08/2004). 

                       No mais, me reporto à decisão de fls. 2419/2423. 

                       A alegação de que a escuta ambiental é prova ilícita não merece prosperar. Em que pese o direito à intimidade, bem como o direito do advogado entrevistar-se de forma isolada com seu cliente no parlatório, tem-se que tais direitos são relativos, podendo ser suprimidos em razão do interesse público.  

                       No presente caso, temos que os direitos individuais dos acusados, se estão a servir de proteção para o exercício de atividade criminosa e ilícita, devem, por óbvio, ceder em face do interesse estatal em impedir a prática de outros delitos. Ademais, temos que a escuta foi devidamente autorizada, em decisão devidamente fundamentada a fls. 465/472, à qual também me reporto. 

                       Quanto à qualidade e a ausência de peritos na escuta, isso será avaliado oportunamente, de modo a sopesar sua valoração. 

                       A falta de intimação do defensor da ré Valéria para a inquirição da testemunha José Victor Cunha foi sanada, vez que não foi argüida em tempo oportuno. Ademais, houve intimação da ré em audiência, conforme se depreende de fls. 3043. 

                       A ilegalidade da busca e apreensão não restou configurada. Tal procedimento foi autorizado judicialmente, pelo mandado de fls. 104, em conformidade com os dispositivos legais, inclusive o artigo 5º, inciso XI, da Carta Magna, como suscitado pela defesa. Além disso, as formalidades legais previstas para busca e apreensão em escritório de advocacia foram atendidas, razão pela qual não há que se falar em ilegalidade das provas colhidas nesse procedimento. 

                       Não deve prosperar a alegação de inépcia da denúncia. A peça acusatória foi incisiva e descreveu de forma pormenorizada as ações de cada um dos acusados, apontando datas e narrando satisfatoriamente a conduta criminosa dos réus. 

                       A peça acusatória foi precisa em relatar os fatos, seu contexto e suas conseqüências, formando uma narrativa coesa, bem estruturada e em conformidade com o previsto no artigo 41 do Código de Processo Penal. Portanto, não apresenta qualquer vício. 

                       Desnecessária a conversão do julgamento em diligência pois as diligências requeridas pela defesa da ré Libânia, na fase do artigo 395 do Código de Processo Penal, já foram apreciadas pela decisão de fls. 2469/2473 e suas determinações foram cumpridas (fls. 2622, 2753, 2757 e 2948). 

                       No mais, as diligências que foram cumpridas já se mostraram suficientes para a formação do convencimento do Juízo. 

                       Saliento que, ao contrário do que se alega a fls. 3669/3677, considero as decisões que autorizaram as interceptações telefônicas devidamente fundamentadas, não havendo qualquer nulidade a reconhecer. 

                       Cumpre destacar que não houve nulidade alguma na utilização de videoconferência no interrogatório de alguns acusados. O sistema de videoconferência utilizado nos autos possibilitou aos réus a comunicação prévia com seus defensores, por fone próprio e com preservação da privacidade, sendo que o acusado, de onde estava, era acompanhado por advogado, assistia e escutava todos os atos da audiência como se estivesse presente, não ocorrendo, assim, qualquer prejuízo à defesa ou acusação. 

                       Tal recurso foi inteligentemente aplicado no caso, em especial tendo em vista o grande percurso seria percorrido na remoção dos acusados, que são de extrema periculosidade. O sistema utilizado criou uma situação análoga a uma audiência comum, sendo observados todos os direitos e prerrogativas do interrogando, bem como os fundamentos e objetivos de tal fase processual. Não houve, portanto nulidade ou cerceamento de defesa na utilização de tal recurso. 

                       Nesse sentido já decidiu o E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, “PROCESSO-CRIME – Interrogatório – Realização por videoconferência – Nulidade – Inocorrência – Ato cuja tecnologia permite o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa, reduzindo ainda os custos ao erário e a insegurança da sociedade – Paciente, ademais, considerado de alta periculosidade – Ordem denegada” (Habeas Corpus nº 428.580-3/8-00 – 1ª Câmara Criminal – Relator: David Haddad – 01.09.2003 – V.U.). 


                        E ainda, “A realização de ato processual pela videoconferência diz respeito à forma do ato. E esta pode ser feita sem compromisso com o modo pré-concebido pelo legislador (que à época ignorava a computação), bastando que alcance o fim colimado sem infringir as regras de garantia. Por isso esse sistema de realização de atos processuais é aceito na quase totalidade dos países onde prevalece o direito ocidental, quer naqueles que adotam o sistema da civil law quer nos regidos pela common law. Muito se teria que imaginar para identificar prejuízo que, "frente a frente" juiz e réu por via da informática, resultasse como afrontoso ao artigo 185 do Código de Processo Penal. A relevância absoluta das formas já não vige no direito como preceito geral, mas foi substituída pelo princípio da instrumentalidade. Isto é, assim como o direito processual existe para servir de instrumento, é meio de realização do direito material, a forma estabelecida para um ato serve para que ele alcance o respectivo escopo, é meio para garantir-lhe a eficácia. A informática no interrogatório não tem categoria de ato processual, é simples meio a concretizar o ditame da lei processual, é maneira de cumprir o ato processual. E os atos processuais, repita-se, não têm a forma como fim em si mesma. As normas que os modelam não dispensam, por isso, uma interpretação saneadora do desvirtuamento de seus objetivos. Via de conseqüência, todo código de processo moderno consagra preceitos relativizadores das nulidades. Eles asseguram ao processo e respectivos atos o cumprimento de sua missão, não os transformando em fins de si mesmos. Na linha dessa diretriz é que se escreveu o artigo 563 do Código de Processo Penal: "Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa". Trata-se de preceito com categoria de "sobredireito processual", isto é, ele se sobrepõe às demais regras processuais, condicionando-lhes a imperatividade. A nulidade constitui sanção de invalidade ao ato desobediente ao modelo da lei. O artigo 563 do Código de Processo Penal neutraliza a pena que, em princípio, deverá sofrer o ato processual rebelde ao traçado da lei. É ele regra antiformalista, autêntico "sobredireito processual" (Habeas Corpus n.° 1.129.771-3/1 - Voto n.° 7914 - Comarca de São Paulo - Impetrante: Daniela Maxta Rodrigues Mota Singer - Paciente: André Luís Sicherolli). 

                       No mérito, tem-se que a ação é parcialmente procedente.   

                       Relativamente à acusada Libânia, os documentos de fls. 649/653, 2757, 2894/2945 e 2948/2951 comprovam sua relação com os co-réus presos e em especial na execução de ordens e serviços espúrios, não se devendo falar em insuficiência probatória para absolvê-la. 

                       Tais provas também atingem os réus Orlando, Anderson e Cláudio, por se referirem especificamente a eles e demonstrar a conexão criminosa existente com as rés.

    

                       Os indícios presentes na fase policial foram completamente respaldados pela prova oral, formando a certeza que levou ao entendimento desse Juízo.

               

                       As rés Valéria e Libânia, ouvidas na fase extrajudicial, confessaram a autoria dos delitos.  

                       Valéria afirmou, em declarações prestadas ao GAECO, que foi contratada por Anderson de Jesus para defendê-lo em uma sindicância e acabou prestando diversos serviços para ele e para outros integrantes do “PCC”, passando a trabalhar para a facção. Confessou que transmitia recado entre presos e prestava outros serviços, como entrega de documentos, ordens da cúpula da organização e prestação de contas de atividades ilícitas. Contou que, em junho de 2006, “Macarrão” (ORLANDO) pediu para ela transmitir uma ordem de “virar” duas cadeias, Flórida e Lavínia, para Anderson, pedido esse que foi atendido. Por ter uma ordem descumprida, Orlando destituiu a ré de sua função, passando-a para Eduardo e Libânia. Disse também que forneceu celulares a Anderson e que algumas ordens transmitidas por ela foram amplamente atendidas e que atuava também, a pedido dos presos, junto à organização “Nova Ordem”. Demonstrou ter amplo conhecimento da organização da facção criminosa e informou ter auferido cerca de R$ 20.000,00 em dois meses de serviço prestados ao “PCC” (fls. 96/100). 

                       Ouvida em uma segunda oportunidade, no mesmo dia e agora na DIG de Presidente Prudente, Valéria ratificou integralmente suas declarações e relatou outros serviços prestados por ela, como transmissão de ordens de compra e venda de entorpecentes e realização de seqüestros (fls. 95). 

                       Libânia confessou que prestava serviços para o “PCC”, entrando e saindo de presídios, com a finalidade de transmitir ordens de dentro da facção criminosa. Narrou que recebeu ordem de Orlando para mandar “virar” as penitenciárias de Araraquara e Itirapina II, que repassada, via celular, para o réu Cláudio, sendo cumprida, inclusive, com a “virada” de Mirandópolis, que não constava na ordem original. Além disso, recebeu recomendação de Orlando para que fizesse chegar ao co-réu Eduardo a ordem de providenciar R$ 15.000,00 em dinheiro e três aparelhos celulares, para entrar na Penitenciária de Presidente Venceslau, sendo que repassou o recado para Claudio, e também iria encaminhar recados para Marcos William Herbas Camacho, o “Marcola”, mas foi presa antes de executá-los. Disse que fez entrar celulares em presídios com ajuda de agentes penitenciários. Por fim, disse mantinha contato com a organização “Nova Ordem”, a qual acredita ser uma “organização de fachada do PCC” (fls. 297/300). 

                       Já os outros acusados negaram qualquer envolvimento com os fatos narrados na peça inicial acusatória. 

                       Eduardo aduziu que nunca trabalhou para a facção criminosa “PCC”, somente prestando serviço para alguns presos que se rotulam como membros de tal organização. Fez referência aos co-réus Orlando e Anderson, afirmando que eram clientes seus, sendo essa relação estritamente profissional. Esclareceu que o dinheiro encontrado em sua residência era proveniente de honorários e de retiradas de sua empresa, que somente transmitia recados legais e que realmente foi procurando para introduzir celulares no Presídio II de Venceslau, mas não o atendeu por saber que não poderia realizar tal missão (fls. 553/554). 

                       Em nova oitiva Eduardo confirmou que os co-réus Orlando e Anderson eram clientes seus, mas que essa relação era somente profissional e prestou esclarecimentos sobre objetos encontrados em sua residência (fls. 622/623). 

                       Orlando alegou conhecer os advogados Eduardo, Valéria e Libânia, mas disse que não pediu para que nenhum deles transmitisse recados a outros presos e que não faz parte da facção Primeiro Comando da Capital (fls. 2353). 

                       Anderson negou a acusação e afirmou que Eduardo e Valéria já trabalharam para ele, sendo a relação entre eles meramente profissional. Negou ser integrante do “PCC” (fls. 2357). 

                       Cláudio afirmou conhecer Libânia, mas jamais transmitiu ordens por intermédio dela. Confessou fazer parte da facção “PCC”, mas não exerce qualquer tipo de posto ou liderança na organização (fls. 2361). 

                       Em Juízo, todos os réus negaram a autoria. 

                       Valéria aduziu que Orlando e Anderson eram seus clientes e que foi obrigada a assinar o depoimento extrajudicia

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