Segunda-feira 1 de maio de 2018 | Presidente Prudente/SP

Veja sentença que condena Juliano Garcia por homicídio culposo e falsidade

Da Redação

Em 28/11/2008 às 16:53

Leia a seguir a sentença do juízo da 1ª Vara Criminal de Presiente Prudente, que condenou o médico e prefeito eleito de Álvares Machado, Juliano Ribeiro Garcia, por homicídio culposo e falsidade ideológica. 

JULIANO RIBEIRO GARCIA, qualificado às fls. 1049 , está sendo processado como incurso nas penas do artigo 121, §§ 3º e 4º e no artigo 299, ambos do Código Penal, porque, como médico obstetra, na Santa Casa de Misericórdia da cidade de Álvares Machado, situada nessa mesma cidade, desta Comarca, no dia 10 de outubro de 2005, culposamente, deu causa à morte do recém-nascido de SUELI MARIA ELEUTÉRIO PEREIRA, morte essa que veio a ocorrer no dia 29 de abril de 2006, no Hospital Estadual "Dr. Odilo Antunes de Siqueira" desta cidade de Presidente Prudente, em conseqüência de anoxia cerebral com parada cardíaca devido descolamento prematuro de placenta. Consta ainda que, nesse mesmo dia 10 de outubro de 2005, na Santa Casa de Álvares Machado, desta Comarca, o réu omitiu, em documento particular, declaração que dele devia constar, com o fim de prejudicar direito e alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. Segundo se apurou, o réu, como médico obstetra, diretor clínico e plantonista na Santa Casa de Misericórdia da cidade de Álvares Machado, a partir do 7º mês de gestação, passou a acompanhar a gestante Sueli Maria Eleutério Pereira, então com 40 anos de idade, hipertensa, multípara, com três partos normais e um por cesariana. No dia 28 de setembro de 2005, após atendimento à referida gestante, marcou a realização do parto para o dia 10 de outubro de 2005, segunda-feira, um dos dias de seu plantão na Santa Casa de Álvares Machado. Da ficha clínica de fls. 1177, subscrita pelo próprio réu, consta que a data provável do parto seria 17 de outubro de 2005 (embora conste 2006), bem assim que a gestante estava usando, em razão da hipertensão arterial, o medicamento "Metildopa". Nesse dia 10 de outubro de 2005, por volta das 09h45, a gestante SUELI MARIA, mesmo não apresentando dor ou contrações e "nem perdas vaginais", compareceu na Santa Casa da cidade de Álvares Marchado e, após ser atendida pelo réu, foi internada sob seus cuidados. Na ocasião, o mesmo anunciou à própria gestante que ela tomaria "um soro para ter contração". Nessa mesma data, já estava internada, também aos cuidados do réu, uma outra gestante. Consta que, por ocasião da internação, o réu prescreveu medicação anti-hipertensiva (metildopa 500 mg, Via Oral, de 6 em 6 horas); soro glicosado a 5%, de 500 ml, administrado a 35 gotas por minuto, além de determinar controle do Batimento Cardíaco Fetal de hora em hora. Ocorre que o réu, verbalmente, como era praxe em suas pacientes, para indução do trabalho do parto, determinou à enfermeira Ruth Francisquetti de Farias e, posteriormente, à auxiliar de enfermagem Maria Aparecida de Faria Aglio, que ministrasse à gestante Sueli, no soro, o medicamento ORASTINA, que tem como substância ativa, a oxitocina, medicamento esse que, de fato, consoante bula anexada aos autos, tem indicação para indução do parto a termo. Em razão da ordem recebida, mesmo sem ter a devida prescrição no prontuário médico, a enfermeira Ruth administrou o medicamento ORASTINA com soro glicosado de 500 ml a 5%, por via endovenosa. Igualmente, a auxiliar de enfermagem Maria Aparecida, consoante ordem verbal recebida do réu, também administrou, no soro da gestante Sueli, três ampolas de ORASTINA, deixando correr a 20 gotas por minuto. Registre-se que, consoante se vê da ficha clínica de fl. 1177, subscrita pelo próprio réu, a bolsa foi rompida por volta das 15 horas. Apurou-se, ainda, que o próprio réu administrou mais duas ampolas de ORASTINA (por volta das 16 horas) que ele mesmo foi buscar no Postinho, onde ficam armazenados os medicamentos, administração medicamentosa essa que também não foi registrada no prontuário médico da referida gestante. Assim, além da quantidade administrada pela enfermeira Ruth, foram administradas à gestante Sueli, no soro glicosado de 500 ml a 5%, no mínimo, cinco ampolas de ORASTINA, o que configura superdosagem, consoante se depreende da advertência expressa contida na bula do próprio medicamento. Esclareça-se que, consoante as notas fiscais anexadas aos autos, a Santa Casa de Álvares Machado adquiria e utilizava o medicamento Oxiton 5UI, c/50 x 1ml (que possui o mesmo princípio ativo da ORASTINA), ou seja, caixa com 50 ampolas, cada ampola contendo 5UI em 1ml. Para se ter uma idéia da quantidade usada desse medicamento no referido Nosocômio, basta ver que, no dia 20 de setembro de 2005, foram adquiridas três caixas de 50 ampolas de OXITON e, dez dias depois, ou seja, em 30 de setembro de 2005, foram adquiridas mais três caixas de 50 ampolas. A outra aquisição deu-se no dia 20 de outubro de 2005, quando foram compradas mais duas ampolas do OXITON. A administração desse medicamento conhecido pelo nome ORASTINA, consoante recomendação do laboratório e como consta da bula, deve ser feita em ambiente hospitalar, sob supervisão de um médico e a posologia indicada para indução do trabalho de parto é de 5 UI, com velocidade inicial de infusão regulada para 1 a 4 mU/min (2 a 8 gotas), que pode ser acelerada em intervalos não inferiores a 20 minutos, podendo atingir, na gravidez quase a termo, infusão interior a 10 mU/min (20 gotas/min), sendo a velocidade máxima recomendada de 20mU/min (40 gotas/min). Fácil de constatar, portanto, a administração de dosagem bem superior à preconizada e, ainda mais, sem o controle e supervisão do réu, acerca da reação provocada na gestante e no nascente. Apurou-se mais que o réu, após a administração desse medicamento OXITON, quer pelas suas auxiliares, quer por si próprio, não permaneceu no hospital acompanhando a gestante, embora estivesse em plantão, tendo determinado que fosse avisado sobre qualquer alteração e, pelo que se apurou, dirigiu-se a seu consultório médico, situado fora do hospital, embora distante desse cerca de 100 metros. Consta que, somente uma hora depois é que o réu voltou e examinou novamente a gestante SUELI, após o que retornou para seu trabalho no consultório particular. Consta que, por volta das 17h30 horas, em razão de a gestante reclamar de fortes dores abdominais, a médica anestesista Renata Assef Delorenzo Barreto Garcia, mulher do réu, que também presta serviços na Santa Casa de Álvares Machado, chegou a examinar a gestante SUELI e disse que o parto ainda ia demorar. Consta ainda que, a partir das 18h40, a auxiliar de enfermagem Maria Aparecida de Faria Aglio constatou a presença de sangramento vaginal e, na ausculta, não ouviu os batimentos cardíacos fetais, pelo que avisou a enfermeira Ruth, que a orientou a chamar o réu. Consta que o réu fora chamado por telefone e se fez presente na Santa Casa, isso por volta das 19 ou 19h05. Apurou-se, finalmente, que o réu, após examinar a gestante determinou o encaminhamento da mesma ao Centro Cirúrgico, onde, com atuação da médica Renata que aplicou anestesia, foi realizado parto cesáreo, que se deu por volta das 19h15. O nascente, todavia, não apresentou movimentos respiratórios e encontrava-se cianótico e bradicardico, sendo amparado pela enfermeira Ruth, após o que a médica anestesista Renata Assef Delorenzo Barreto Garcia executou manobras de reanimação, sendo registrado na ficha médica de fls. 988: "Apgar 1º 01; 5º 02; 10' 06". Posteriormente foi acionado o médico pediatra Mitsuji Seki, que, deu seqüência aos tratamentos do recém-nascido e o transferiu para o Hospital Estadual, onde a criança, que foi chamada Victor Hugo Eleutério dos Santos, veio a falecer no dia 29 de abril de 2006 (certidão de óbito a fl. 1015). Apurou-se que, nesse mesmo dia 10 de outubro de 2005, na Santa Casa de Álvares Machado, desta Comarca, o réu, após examinar e internar a gestante SUELI MARIA ELEUTÉRIO PEREIRA, prescreveu no prontuário médico, documento particular, porquanto se trata de um "conjunto de documentos formados pela história clínica e exames físicos de admissão do paciente no hospital, prescrições médicas diárias e evoluções clínicas diárias", mas, omitiu, no campo próprio "PRESCRIÇÃO MÉDICA", a prescrição do medicamento OXITON, cuja prescrição deu-se de forma verbal ao corpo de enfermagem, ou seja, três ampolas desse medicamento, para correr no soro de 500 ml a 20 gotas, bem como deixou de anotar as duas ampolas desse mesmo medicamento que administrou, pessoalmente, na gestante SUELI. A prescrição desse medicamento, como toda e qualquer prescrição medica, devia constar desse documento e a omissão deu-se com o fim de prejudicar direito da gestante em conhecer os medicamentos que lhe foram administrados, bem como de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante, porquanto a anotação expressa dessa prescrição medicamentosa, porque conhecido o risco de superdosagem e das reações adversas do uso da OXITOCINA, traduzir-se-ia em prova contra si. Acompanha a denúncia o respectivo inquérito policial.

A denúncia foi recebida por despacho datado de 11 de dezembro de 2007, (fls. 1306/1307), tendo o réu sido interrogado (fls. 1359/1361), apresentou defesa prévia (fls. 1363/1364) e na instrução do feito ouviram-se nove testemunhas (fls. 1370/1375, 1381/1384, 1394/1396, 1415).

Na fase do artigo 499 do Código de Processo Penal as partes nada requereram (fls. 1419 e 1422).

Em alegações finais, o Nobre Dr. Promotor de Justiça (fls. 1424/1455) pediu a condenação do réu, nos termos da denúncia, ante a prova carreada para os autos. Por sua vez, o Ilustre Dr. Defensor (fls. 1459/1475), bateu-se pela absolvição do réu, alegando insuficiência probatória.

É o Relatório.

D E C I D O.

1. A denúncia imputa ao réu, como médico obstetra, diretor clinico e plantonista da Santa Casa de Misericórdia de Álvares Machado, nesta comarca, o delito de homicídio culposo porque, no atendimento a gestante Sueli Maria, mesmo não apresentado ela dor, contração ou perdas vaginais, prescreveu remédio contendo Orastina em alta dose para acelerar o parto, o que acabou fazendo com que houvesse sangramento vaginal e realização de cesárea, mas o nascente não apresentou movimentos respiratórios, apresentando cianótico e bradicardico, sendo realizado manobras de reanimação, transferindo o nascente para o Hospital Estadual de Presidente Prudente, aonde veio a falecer no dia 29 de abril de 2006, constatando que o recém nascido sofreu anoxia cerebral com parada cardíaca devido ao deslocamento prematuro da placenta.

A materialidade do delito de homicídio culposo está comprovado nos autos, pelo laudo de exame de corpo de delito realizado no recém nascido de Sueli Maria, constatando apresentar ele anoxia central por parada cardiorespiratória, podendo caracterizar lesão grave; pelo ofício do núcleo de perícia médico-legal de Presidente Prudente informando haver no recém nascido ferimento de massagem cardíaca; e pelo laudo complementar, necroscópico de fls. 1035/1036, que concluiu ter o recém nascido de Sueli Maria falecido em razão de anoxia cerebral com parada cardíaca devido ao deslocamento prematuro da placenta.

A denúncia atribui ao réu Juliano culpa pela morte do recém nascido, por ter agido ele com imprudência e negligência, com falta da atenção devida e dos cuidados especiais indicados pela ciência médica, cujo dever tinha que empregar, concorrendo de forma eficaz para a morte do recém nascido de Sueli Maria por administração de Orastina, com super dosagem ou dosagem excessiva, causando o deslocamento prematuro da placenta.

Quando interrogado em Juízo sobre este fato (fls. 1359/1361), o réu narrou que a partir do sétimo mês de gestação, passou a acompanhar a gravidez de Sueli Maria, gestante com mais de quarenta anos de idade, hipertensa, com dois partos normais e uma cesariana, anteriormente. Examinando Sueli Maria, constatou que ela estava com três centímetros de dilação vaginal e que o bebê estava maduro, por isso passou a fazer a indução do parto. Sueli Maria foi internada para receber soro e acompanhamento do coração fetal. Em razão da grande movimentação no dia do internamento, solicitou a enfermeira Ruth que aplicasse em Sueli Maria, Orastina, para iniciar a indução do parto. À tarde, mesmo acabando o seu plantão, continuou a acompanhar Sueli Maria. Por volta das dezenove horas, novamente examinou Sueli e não constatou nada de anormal. Logo depois, recebeu telefonema de uma enfermeira dizendo que Sueli Maria informava que estava com dor e que o bebê não mais mexia. Retornou ao hospital e diagnosticou sangramento vaginal e deslocamento da placenta, então, realizou cesárea de urgência. Como o bebê não tinha movimentação respiratória e muscular, foi encaminhado para o Hospital Estadual e cerca de seis meses depois acabou falecendo.

Nega o réu Juliano a administração de Orastina em super dosagem ou que tenha sido causador do deslocamento da placenta.

Essa sua negativa não pode ser acolhida posto que é desmentida pela prova dos autos, que demonstra que o réu teve a conduta que a denúncia lhe imputa, ou seja, descuidadamente, imprudentemente, administrou ou determinou administração de Orastina em superdosagem causando o sangramento vaginal e o deslocamento da placenta de Sueli Maria.

A vítima em Juízo (fls. 1370/1371), narra que passou a ter problema de pressão alta no oitavo mês e por isso o réu marcou data certa para interná-la, dia 10 de outubro. Foi no hospital nesta data e ali quando o réu compareceu, por determinação dele, foi levada para um quarto, "aonde as gestantes ficam esperando a hora do parto. Aí a declarante recebeu medicação que o Dr. Juliano determinou a enfermagem que lhe desse. Não tinha qualquer dor ou sinal de parto. Por volta das dezenove horas, a declarante teve complicação. Os problemas foram hemorragia e deslocamento da placenta. O Dr. Juliano realizou a cesárea para a retirada do nenê que praticamente estava morto. O nenê foi levado para o Hospital Estadual. Praticamente ficou no hospital no período da manhã até o inicio da noite, quando foi realizada a cesárea. Só tomou remédio no período que esteve no quarto de preparação das grávidas para o parto. Nenhum outro médico lhe examinou na Santa Casa de Álvares Machado, quando dos fatos acima. Entretanto, as enfermeiras iam constantemente lá ouvir o coração do bebê".

A vítima confirma a internação pelo réu, a colocação no quarto especial para esperar o inicio do processo de parto, o fornecimento de remédios e o sangramento, com a cesárea em seguida.

A enfermeira Ruth (fls. 1372/1373), informa que ingressou no serviço da santa casa por volta das quinze horas e que a vítima estava num quarto destinado às pessoas que estão para entrar ou já estão em processo de parto. Afirma que a droga Orastina, destinada a indução do parto normal, foi dada a vítima, embora não saiba esclarecer quem fez a aplicação, mas a determinação foi do médico. Fizeram controle do batimento cardíaco do bebê. Quando o coração começou a bater fraco, comunicaram o Dr. Juliano que veio rápido e fez a cesárea. Confirma ainda que fez os lançamentos constantes da ficha de internação.

Maria Aparecida (fls. 1374/1375), narra que a vítima compareceu na santa casa para realizar o parto, tendo o Dr. Juliano a examinar e mandado dar-lhe um sorinho. Sueli ficou num quarto tomando sorinho e de vez em quando, o réu ia lá ver como ela estava. Confirma que o Dr. Juliano embora não prescrevesse e não mandasse constar do prontuário, receitou que se colocasse no sorinho de Sueli, o remédio Orastina. Constatou em determinado momento sangramento, por isso foi comunicado a outra enfermeira que chamou o réu, que veio rapidamente e re e realizou a cesárea.

Neusa Maria (fls. 1381/1382), informa que quando assumiu o serviço, Sueli Maria já apresentava sangramento vaginal e contrações, por isso foi submetida à cesárea pelo Dr. Juliano. Viu nas fichas de anotações prescrição de soro com Orastina, remédio destinado a induzir o parto. Essa determinação ou prescrição foi feita pelo Dr. Juliano.

Neusa Joana (fls. 1383/1384), narra que só tomou conhecimento dos fatos quando Sueli Maria entrou na sala do centro cirúrgico. Outras enfermeiras comentaram que Sueli Maria tinha tomado Orastina.

Este conjunto probatório já é suficiente para ter-se como comprovados os seguintes pontos: o réu examinou a paciente que apresentava problemas de pressão durante a gravidez e já marcou a data para o parto ou para internação. Na data marcada, Sueli Maria compareceu à santa casa e foi examinada pelo réu. Constatou-se que ela não tinha contração ou dilatação vaginal. Para induzir ao parto o réu determinou a aplicação de soro com Orastina, para iniciar a indução do parto normal.

Esses fatos demonstram já que o réu não agiu conforme a orientação técnica que tinha em razão da profissão, posto que Sueli Maria não tinha qualquer sinal para fazer a indução do parto. Ao contrário, Sueli Maria não tinha dilação vaginal e a indução era arriscada.

Demonstra mais ainda a prova, que por orientação verbal, e que muitas vezes não chegou a ser da forma escrita, as enfermeiras obedeceram ao réu, aplicando soro com Orastina e acompanharam o controle cardíaco do nenê. Demonstrado mais ainda que depois de um dia de internação, houve sangramento e a diminuição das batidas cardíacas do nenê, sintomas que previstos como conseqüências da prescrição da Orastina.

A perícia constatou o deslocamento da placenta, um dos sintomas da Orasitna.

O conjunto probatório dos autos demonstra mais ainda, que o réu tinha por hábito, internar pacientes num segundo quarto para realizar partos e o maior numero de partos possíveis, nos dias em que estava de plantão na Santa de Misericórdia de Álvares Machado.

O controle de compra e uso de medicamento da Santa Casa de Misericórdia, demonstra grande uso de Orastina nos dias que o réu estava de plantão, aqueles dias que ele realizava os partos, valendo observar que chegou ele realizar nove partos em nove de junho de 2004 e oito partos, em 15 de setembro de 2004.

Não tinha a gestante Sueli Maria qualquer sinal ou qualquer exame técnico ou laboratorial que indicasse a indução do parto ou a aplicação da Orastina, sendo que o réu fez para obter a antecipação, realizar o parto na data que ele havia determinado. A supervisão foi pelas enfermeiras e não pelo réu, como recomenda a bula do remédio Orastina, já que a prova demonstra que em determinado momento o réu passou a cuidar do consultório e vinha para o hospital, cem metros do consultório, esporadicamente e quando chamado.

Não há dúvida de que foi a Orastina, ministrada, no mínimo, na parte da manhã, que foi prescrita pelo réu, causou o deslocamento da placenta e dificuldade de batimento cardíaco pelo bebê.

Transferir o acompanhamento dos efeitos da Orastina foi, no mínimo, negligente pelo réu.

Prescrever Orastina para quem não tinha nenhuma recomendação foi, no mínimo, imprudência do réu.

Essa negligência e esta imprudência, é que levaram ao deslocamento da placenta, ao dano ao bebê e a morte do bebê, como constatou a perícia.

Por tudo isto é que é de rigor a condenação do réu pelo crime de homicídio culposo que a denúncia lhe imputa.

2. A denúncia também imputa ao réu o crime de falsidade ideológica porque ao examinar e internar a gestante Sueli Maria, prescreveu no prontuário médico, documento particular, mas omitiu a prescrição do medicamento denominado Oxiton, cuja a prescrição verbalmente determinou a enfermagem.

 

A materialidade deste delito está demonstrada nos autos, pelos documentos de fls. 1172/1179, pelo parecer médico de fls. 1264/1265 e pela prova oral carreada para os autos.

Quando interrogado em Juízo, na presença de defensor constituído, o réu confirmou que atendeu a gestante Sueli Maria e que determinou a sua internação para receber soro glicosato e realização da tricotomia, bem como acompanhamento do coração fetal. "Na manhã do internamento havia um movimento muito grande na Santa Casa de Álvares Machado tendo o interrogando realizado dois partos, por isso solicitou a enfermeira Ruth para aplicar na vítima Sueli, Orastina, para iniciar o processo de indução de parto".

A enfermeira Ruth quando ouvida em Juízo (fls. 1372/1373), confirma que Orastina foi dada a gestante Sueli Maria.

A enfermeira Maria Aparecida (fls. 1374/1375), confirmou que quando da internação de Sueli Maria, o réu, após examiná-la, mandou dar um sorinho para ela, informando mais que ele falava, mas não escrevia, não prescrevia que se colocasse no sorinho o remédio Orastina. Ele não gostava que constassem do relatório da enfermagem essa prescrição dele, ele achava ruim e já chegou até tirar folha do prontuário por causa desta anotação.

Não há dúvida, pela prova oral e inclusive pela confissão do réu de que, no mínimo, no ato do internamento, foi prescrito por ele a aplicação em Sueli Maria do remédio Orastina.

Essa prescrição deveria constar da ficha de internamento de Sueli Maria, cujos originais estão no processo (fls. 1169/172), mas não se vê a anotação da prescrição do medicamento.

Um dos deveres do réu, como médico, era anotar toda prescrição de medicamento que fez à vítima, o que ele não fez.

Não sobra dúvida que o réu não escreveu a prescrição da Orastina pela resposta a consulta deste Juiz, feito ao médico legista (fls. 1180/1181).

Não há dúvida que as fichas de internação hospitalar constituem documento, pois é escrito por um autor contendo exposição de fatos de relevância jurídica, como a prescrição médica. O seu conteúdo é juridicamente importante e a sua omissão leva a um documento ideologicamente não verdadeiro.

O prontuário ou a ficha de internação médica é indispensável para todos, principalmente, para avaliação dos serviços médicos prestados e nos termos do código de ética médica o médico tem obrigação de notar a prescrição, o que não fez o réu, como ele mesmo confessou em Juízo.

Não há dúvida de que o réu omitiu no prontuário ou na ficha de internação a prescrição do medicamento Orastina.

3. Na dosagem da pena, levo em consideração as circunstâncias judiciais do artigo 59, do Código Penal, favoráveis ao réu, principalmente sua primariedade técnica, fixando a pena pelo delito de homicídio culposo em 01 (um) ano de detenção, que acrescento de 1/3 (um terço) pela causa de aumento do § 4º, artigo 121, do Código Penal. Pelo delito de falsidade ideológica, fixo e torno definitiva a pena, no mínimo legal de 01 (um) ano de reclusão.

Preenche o réu os requisitos legais, assim, substituo as penas corporais acima fixadas, por penas restritivas de direito, pena pecuniária em favor dos herdeiros de Victor Hugo Eleutério dos Santos, no valor correspondente a 100 (cem) salários mínimos vigente na época dos fatos narrados na denúncia e prestação de serviço à comunidade, pelo prazo de 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses, mediante as condições a serem estabelecidas pelo Juízo da Execução. Penal.

ISTO POSTO e o que mais dos autos consta, JULGO PROCEDENTE a presente ação penal e CONDENO o réu JULIANO RIBEIRO GARCIA, qualificado nos autos, a cumprir as penas de 01 (um) ano de reclusão e 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de detenção, substituídas por pena pecuniária no valor de 100 (cem) salários mínimos vigente na época dos fatos narrados na denúncia, em favor dos herdeiros de Victor Hugo Eleutério dos Santos e prestação de serviço à comunidade, pelo prazo de 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses, mediante as condições a serem estabelecidas pelo Juízo da Execução Penal, como incurso nos termos dos artigos 299 e 121, §§ 3º e 4º, ambos do Código Penal.

Lance-se o nome do réu no rol dos culpados.

Em caso de revogação das penas restritivas de direito, o réu cumprirá as penas corporais fixadas nesta sentença, no regime aberto.

Quando da execução, a pena pecuniária deverá ser corrigida monetariamente a partir da data dos fatos da denúncia.

Condeno ainda o réu ao pagamento das custas processuais no valor equivalente a 100 (cem) UFESPS, nos termos do artigo 4º, § 9º, "a", da Lei Estadual nº 11.608/2003. Todavia, não tendo ele situação econômica privilegiada, ficará isento do pagamento enquanto mantiver a condição de necessitado (artigo 12, da Lei 1.060/1950).

Publique-se,

Registre-se,

Comunique-se e

Intimem-se.

Presidente Prudente, 14 de novembro de 2008.

 

ANTONIO ROBERTO SYLLA

Juiz de Direito 

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