(*) João Bosco Leal
Em 19/03/2012 às 10:37
Recentemente fui questionado sobre a coragem necessária para superar os mais diversos tipos de dificuldades pelos quais já havia passado. No momento da inesperada pergunta, não sabia como responder, pois nunca havia pensado sobre o assunto.
Procurei então entender que situação seria essa que, pelo menos naquele momento não me atingia, mas sim a meu interlocutor, que certamente me questionava em busca uma solução para algo que o afligia.
As dificuldades a que se referia poderiam ser financeiras, educacionais, de saúde, emocionais ou muitas outras, para mim desconhecidos, e precisava me informar melhor para poder tentar ajudá-lo.
Apesar de reconhecer que a vida já havia me pregado peças dos mais variados tamanhos e intensidades, tinha também a consciência de que muitas outras ainda poderiam acontecer sobre temas para mim ainda desconhecidos ou mesmo repetindo-se algo já vivido.
Por não usar nenhum tipo de bebida alcoólica ou drogas e nunca haver estado próximo de quem as utiliza, esses seriam assuntos sobre os quais muito pouco saberia e, mesmo que soubesse, seria um conhecimento superficial, não profissional ou já vivenciado.
Sobre as dores físicas, sobre as quais realmente poderia me classificar como uma pessoa com experiência bastante significativa, só poderia dizer que delas não adianta reclamar, pois isso só incomodaria nossos próximos, não as aliviando e, portanto, só nos restaria senti-las sozinho, sabendo que passarão.
As perdas emocionais dos relacionamentos, com o tempo se aprende, parecem ser o fim, mas sempre são superadas, normalmente com um novo encontro, uma nova paixão.
Percebendo que o tema objeto do questionamento era sobre a perda de entes queridos, naquele momento não tive outra opção a não ser o de dar um exemplo figurativo, da nossa escrita sobre a página de um caderno escolar, onde escrevemos todas as nossas lições, experiências e aprendizados.
Respondi que imaginasse um diário no qual vamos escrevendo a história de nossa vida, linha por linha, dia por dia e quando a última linha é preenchida, não temos alternativa, precisamos virar a página para continuar escrevendo.
Não poderíamos deixar de virá-la e continuar na mesma página, mesmo que voltando para a primeira linha, pois começaríamos a escrever sobre o que lá já estaria escrito, rasurando o texto e tornando-o incompreensível.
Assim procedendo, logo teríamos nos esquecido de determinadas ocorrências que, por terem sido sobrepostas no caderno, já não poderiam ser revistas, relembradas ou entendidas. Teríamos assim, perdido nossa própria história.
Após uma perda assim, principalmente quando, como era o caso comum, pelo menos cronologicamente ela jamais deveria ocorrer, o único meio de continuarmos nossa vida é virando a página, mas deixando-a lá, documentada.
Para quem a viveu essa é, e sempre será, a página mais importante de seu diário. Nenhuma felicidade ou tristeza posterior será maior que a experiência lá narrada e por isso precisa permanecer bem escrita, clara, de modo a não deixar nenhuma dúvida e para que possa ser visitada por seu escritor toda vez que a dor da saudade chegar.
Virar a página não significa esquecer, mas continuar vivendo da única maneira possível.
(*) João Bosco Leal é articulista político, produtor rural e palestrante sobre assuntos ligados ao agronegócio e conflitos agrários
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