Segunda-feira 1 de maio de 2018 | Presidente Prudente/SP

Prudente e a preocupação com a preservação de sua história

*Rubens Shirassu Júnior

Em 05/08/2017 às 10:18

A imagem urbana pode ser tratada como produto para gerar lucros mais especificamente ao turismo

(Foto: Rubens Shirassu Júnior)

Como anda a política de conservação e preservação do patrimônio histórico do Brasil? Minhas observações se dirigem ao Condephaat, que possui as mesmas atribuições do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), sem esquecer do Conselho Municipal do Patrimônio Histórico.

Como a maioria das cidades brasileiras, Presidente Prudente apresenta pouca preocupação com os vestígios do seu passado, pois os ideais do urbanismo modernista progressista ainda persistem. Em nome do progresso sem fim a especulação imobiliária destrói as matas, florestas naturais, casas, prédios históricos. Em consequência, esquece sua história numa atitude de negar o passado em nome desse falso progresso.

Esse procedimento confunde preservação de bens culturais com atraso e o preço do progresso seria a sua sucessiva substituição. Tanto São Paulo como Presidente Prudente, têm a paisagem urbana sendo transformada ao longo da existência, tendo a substituição de seus edifícios históricos. Não podemos esquecer o envolvimento da comunidade na construção dos elementos significativos materializados ou não em edifícios, constituindo num reforço da identidade do lugar.

Alerto também que nem sempre o objetivo do Prefeito, do secretário de cultura e do Conselho seja motivado por razões de identidade. A imagem urbana pode ser tratada como produto para gerar lucros mais especificamente ao turismo. Independente dos objetivos, o importante e fundamental é a preservação de tais registros para o reforço da identidade desses lugares.

Esse processo de revalorização de Presidente Prudente ainda necessita ser alavancado. Os moradores, os atores sociais, as instituições precisam se envolver no resgate de sua memória. Para reforçar a importância do conjunto arquitetônico, cito o caso do Museu e Arquivo Histórico Prefeito Antônio Sandoval Netto, antigo matadouro, na Rua Dr. João Gonçalves Foz, 2179, próximo a uma rotatória, no Jardim das Rosas, tornou-se fundamental como referencial urbano constituindo-se num elemento de percepção desta paisagem urbana.

O que indica a importância desta referência na legibilidade urbana, na qual a memória e o significado contribuem à formação da imagem da cidade e, quanto mais legível for esta mais forte é a sua identidade.

Urge discutir a renovação e a revitalização do Museu, pois seu conjunto arquitetônico vem sofrendo o processo de perda das características da ocupação do seu lote original, incluindo o retalhamento para outros usos e afins.

Diversas interferências alteraram o espaço original. Carece de restauração, a construção de um espaço mais amplo, para incluir salas de arquivo, compra de equipamentos de conservação, a exemplo de scanners para digitalizar documentos, entre outros equipamentos da tecnologia digital e, de caráter imprescindível, a contratação ou terceirização de profissionais capacitados, conciliando a qualidade espacial e as novas necessidades do mundo contemporâneo, conjugando produtividade cultural, conservação e o direito à memória.

Tendo a sensação de uma área arejada e bem planejada e sem descaracterização, o Museu possibilita um público heterogêneo e, principalmente, de turistas que perceberão o passado, o presente e o futuro propiciando reflexões que contribuam para seu enriquecimento cultural.

Um projeto adequado transformando o local de simples depósito de documentos e objetos antigos para um espaço apropriado ao desenvolvimento de pesquisas e estudos sobre a cultura local e regional, de forma dinâmica, que permita a participação dos seus usuários garantirá a preservação do bem cultural à sua comunidade.

O acervo de patrimônios culturais pode ser caracterizado e classificado em categorias diversificadas. Isto se deve ao fato de que a conservação realmente engloba valores e interesses diferenciados, ou seja, a necessidade e a busca de preservação dependem do entendimento destas categorias em relação ao seu valor histórico e social.

Carlos Alberto Cerqueira Lemos, professor de arquitetura e escritor, destaca a tardia conscientização que aconteceu no Brasil em relação ao pensamento de Preservação do passado, desencadeando posições e medidas de conservação do patrimônio cultural. O escritor e professor de arquitetura argumenta e define as relações que possam vir a existir entre os artefatos e o meio de forma geral.

Assim, tais artefatos apresentam dimensões, usos e escalas de valores diferenciados, a partir de conceitos definidos por órgãos responsáveis e até pela própria sociedade. Além disso, os artefatos criados por um determinado uso podem vir a se estabelecer em uma nova utilidade devido às necessidades decorrentes, ou seja, os costumes, valores, princípios e introdução de novas culturas se alteram ao longo do tempo definidos a partir de novas necessidades.

Levanto a questão do porquê preservar como algo amplo, onde se merece observar todas as diretrizes e características peculiares de cada sociedade. Admito que a industrialização e a especulação imobiliária estão prejudicando esta busca pela própria identidade cultural, mas que tudo é uma questão de adaptação.

A preservação sugere um conceito muito maior, incluindo elementos tanto tangíveis quanto intangíveis, conservando a memória do que seja mais significativo diante do grande patrimônio cultural estabelecido. Claro que, cada grupo dentro da sociedade defende aquilo que lhe pareça mais importante e que apresente maior valor para se preservar.

Além do porquê preservar busca-se o quê preservar. A consciência conservadora estabeleceu-se de forma retarda e individualista, ou seja, as pessoas levantavam bandeiras para a preservação do patrimônio que lhes remetiam a um maior interesse.

Muitos projetos foram formulados com fins de preservação, mas somente na década de 30, Mário de Andrade estabeleceu um projeto que englobou o patrimônio para a preservação deste acervo no Brasil. Neste mesmo contexto surge o Sphan – hoje Iphan – (Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e, de certa forma, seguia a lógica de preservação estabelecida pelo projeto de Andrade, embora mais ligado às questões de interesse público. O Sphan foi desenvolvido com o intuito de promover todas as intervenções nos monumentos.

Quanto ao conceito levantado ao Patrimônio Ambiental Urbano, desde o projeto inovador de Mário de Andrade, este já interpretou o contexto urbano como algo a ser conservado. Porém, devido às constantes transformações que ocorrem nos traçados urbanos existe a dificuldade de preservação, digo a origem mais primitiva, mas possível diante de um prisma conceitual definido.

Diante do patrimônio cultural que se deseja preservar, deve-se definir como se preservar. O principal enfoque neste conceito está relacionado aos bens ditos arquitetônicos que também eram escolhidos de acordo com conceitos e interesses individuais, desde ruínas até construções íntegras que necessitem de uma melhoria específica. O “como” preservar vai depender justamente destas classificações, sem ignorar o meio em que se encontram inseridas.

Diante da busca de preservação destes artefatos arquitetônicos estabeleceram-se medidas mais concretas para este fim, como a Carta de Veneza, desenvolvida por profissionais ligados ao movimento de conservação, com conceitos e métodos de preservação. O tombamento também foi um recurso que começou a ser utilizado para a preservação de uma memória, ou seja, com o tombamento há uma restrição do uso e ocupação de uma determinada edificação para garantir a preservação de uma memória coletiva.

Claro que, atrelada a todas estas questões de preservação, interesses sociais e econômicos participam ativamente deste processo. A principal forma de como preservar o patrimônio cultural está voltado principalmente para a questão de educação popular e em um maior interesse de conservação das classes que dirigem esta conscientização.

Em suma, a consciência de preservação no Brasil nasceu tardiamente e com conceitos prematuros e mal definidos, isto justificado a partir da observação atrasada da definição e estabelecimento do Sphan, diante da falta de interesse em relação ao passado, tanto da classe popular quanto da administração pública, ignorando o fato de que patrimônio cultural abrange vários tipos de categorias e métodos específicos de preservação, merecendo análises próprias para a correta preservação destes bens patrimoniais claramente importantes para a posteridade.

*Rubens Shirassu Jr. é designer gráfico e escritor

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