Segunda-feira 1 de maio de 2018 | Presidente Prudente/SP

'Maneira de viver' trata sobre adaptar-se ao meio

Eliseu Visconti*

Em 09/12/2010 às 15:59

Muitas pessoas sentem-se insatisfeitas com a forma como vivem. Queixam-se do local onde moram, da cidade em que habitam, do trabalho que executam, e assim por diante.

São pessoas, as mais das vezes, doentes, sujeitas a surtos de depressão e angústias permanentes ou temporárias, que resultam em males diversos, como úlceras, alcoolismo, mau humor etc.

Ensino-lhes um remédio para este morfinismo social, que deriva da inadaptação ao meio e envenena a vida.

Somos todos animais, porém o nosso racionalismo, que nos situou acima das outras espécies, acabou por atrofiar certas características próprias de seres que conseguem sobreviver, mediante a prática do mimetismo.

Define-se mimetismo como o processo pelo qual um ser se ajusta a uma nova situação. Caldas Aulete fala em mudança de acordo com o meio.

Camaleões, cavalos-marinhos, rãs e outros bichos possuem esta interessante capacidade de mudar de cor e de formato, e mesmo de voz, para fugir dos predadores e também para caçar. Todos já assistimos a filmes e documentários que mostram tal transformação.

Nós, bichos-homens, parecemos ter perdido a característica do mimetismo, e esbanjamos a nossa insatisfação doentia com o que temos e não temos, sem imaginar que um dos melhores truques para a sobrevivência é incorporar-se ao meio em que vivemos, assumindo a forma adequada a uma existência em harmonia.

Já vivi no Rio de Janeiro, Düsseldorf, Presidente Prudente e em São Paulo.

Gostei de todos os lugares em que estive, ou melhor, incorporei-me àquelas localidades, numa atitude que alguns, talvez, possam rotular de adaptação, ou mesmo de conformismo.

Não, não é nada disso.

Adaptar-se é ceder ao inimigo - ou ao meio. Conformar-se é ser derrotado pelas circunstâncias.

Mimetizar-se é incorporar-se ao meio. Assim, aceitamos suas características, mas impomos as nossas, num processo em que não existem vencedores e nem vencidos.

Quem se adapta ou se conforma poderá aparentar, quem sabe, uma felicidade externa, que não é o eco do sentimento mais profundo.

Baudelaire, grande poeta francês, um dos precursores do simbolismo, fala-nos da “santa prostituição da alma,” ao se referir àqueles que, em meio às multidões, sabem como assumir as identidades dos que os cercam. Diz, ainda, que esta virtude é própria dos poetas e dos missionários. Os poetas gozam, segundo Baudelaire, do incomparável privilégio de serem eles mesmos e outrem, de serem como almas errantes, que procuram um corpo e encarnam uma personalidade. Para eles, tudo está aberto, e se algo parecer fechado, é porque não vale a pena visitar.


Notem bem, amigos, que conservar a própria identidade, mas aprender a ser outrem, passa longe da noção de conformismo ou de mera adaptação. Mimetismo é exatamente este santo poder, que nos faz pertencer ao meio circundante, dele participar, no espírito e no corpo.

 

O mimetismo liquida a noção do estrangeiro, que se limita a vestir os trajes locais, comer a comida típica e a simular uma cidadania que nunca será a sua.

Fernando Pessoa, em suas Reflexões Paradoxais, fornece o que  poderia ser uma bela definição de mimetismo: “... compreender o que outra pessoa pensa é discordar dela. Compreender o que outra pessoa sente é ser ela. Ser outra pessoa é de uma grande utilidade metafísica. Deus é toda a gente.”

Em Roma, como os romanos.

*Eliseu Visconti é jornalista, escritor e atual assessor de imprensa da Câmara de Presidente Prudente

Compartilhe
Notícias Relacionadas

Telefone: 18-98122 7428

© Portal Prudentino - Todos os direitos reservados.