Rubens Shirassu Jr.(*)
Em 16/06/2011 às 10:57
Houve um tempo em que os povos veneravam a lua, cantando
músicas e contando lendas ou “causos” trazidos de seus ancestrais. Essa gente
divulgava, entre outros mitos, tipos de seres extraterrenos que faziam contato
na hora do eclipse. Com a diminuição de seus raios, ocorre um aumento da sombra
nas matas, águas das fontes, mares, vales, cachoeiras e rochas.
Seguindo as tradições milenares, acreditam os chineses, como
descreve um famoso poema, que uma princesa virgem suicidou-se por ter sido
largada no casamento. Pelo trauma do episódio, em todo eclipse, ela vem
procurar um rapaz, usando de todos os meios para convencê-lo a morrer por ela.
Ele, ao partir, com as mãos dadas a ela, fica preso no mundo dos mortos, que
seria o outro lado da lua. Assim, eles chamavam a linda jovem de “A Dama da Lua”.
Então, Deus, o grande arquiteto do mundo, puniu toda a gente
que grita e agride, castigando pela nossa loucura e soberba, profetizavam
certos povos primitivos. A pessoa humana, na sua frente, sumiu, passou a viver
apenas como forma e tons, entrou na longa teoria de imagens ligadas ou soltas.
Tudo que fica dentro desse mundo é confuso, inconstante e sem leis
autorrealizáveis; e quem não ama e compreende o pensará arbitrário e injusto.
Corri os olhos pelas ruelas e avenidas escuras e meus olhos
perderam-se na escuridão, nas pedras das calçadas, meus sapatos fazem ruídos
altos e irregulares. Andava como um cavalo cego. De perto, era tudo um breu,
mas encontrei um fio de luz que mostra a praça Zequinha, no Parque São Judas
Tadeu, pelo perfil indeciso dos telhados marrom- avermelhados no céu noturno.
Dentro do quadro, em volta da pérola branca, existe um azul singelo e antigo,
cor de roupa de adolescente, do tipo jeans nunca lavado.
Talvez, existam povos escondidos e perdidos no universo,
esquecidos pelos meios de comunicação e, também, pelo poder econômico e
político das corporações e exploradores.
Nascem amores, o ódio dos desafetos, a usura, a mesquinhez,
ambição e brotam crianças neste inverno; a lua é cheia, o mar vem crescendo de
fúria sob um céu azul mercúrio e escuro. Mas, a transformação mística e soturna
da lua é passiva e calma, nós sobrevivemos: o mundo continua e as ondas escuras
na lua recuam, desanimadas.
Mas, no sossego de seu laboratório, ela é a rainha:
imponente, solitária, em silêncio, refaz o nosso mundo astral. Não apenas esse
atual em volta dela, que se fragmenta em mil formas, desde a folha amarela e
seca, às construções e avenidas empoeiradas e o ônibus moroso e cheio, os cubos
estéreis dos edifícios de cimento e aço, as vidas vistas pelos limites dos
retângulos das janelas, que contém em seus espaços, caixas com antenas de ondas
até a nesga de mar azul além, lá, muito além.
A lua está se movendo, lentamente, sob os nossos olhos para
viver sua harmonia feliz. Ela é que vai separar o véu negro de sua face branca.
Seu brilho misterioso é o satélite solitário dos aventureiros, símbolo dos
místicos, sonho dos românticos, estandarte de todos os verões, até os da alma.
(*) Rubens Shirassu Jr. é designer gráfico e escritor
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