Rubens Shirassu Jr.
Em 17/10/2013 às 17:01
(Foto: Divulgação)
A pichação representa uma das expressões mais visíveis da invisibilidade humana. Seria mais do que rabiscos, uma forma de estabelecer uma relação de pertencimento com a comunidade – mesmo que por meio de agressão – e, ao mesmo tempo, de dar ao autor um sentido de autoidentidade.
Naqueles garranchos incompreensíveis para muitos, a arte mistura-se à necessidade de dizer simplesmente “eu existo, preste atenção em mim.” Note-se que os pichadores não subiram nos prédios para assaltar, mas apenas para desenhar.
Esse grito de existência, em forma de letras constitui, portanto, a busca de uma aceitação, mas usando a transgressão. E, nisso, surge um foco de tensão. Desconta-se a transgressão na sociedade que exclui, enquanto num círculo vicioso, os garranchos mantém os pichadores excluídos. Quem não vê a pichação por esse lado, não entende todo um mundo subterrâneo que do seu jeito, busca a luz.
Mas a pichação – e aí está seu lado mais polêmico – acaba por impingir, na marra, sem direito à opção, uma estética obrigando o dono de um muro ou da fachada de uma casa a aceitar aquela expressão, como se tivesse de ostentar a lembrança da marginalidade alheia. Se muitos são movidos por um direito ferido – o da expressão –, eles negam o direito dos outros de pintar suas casas como bem entenderem.
Há algum tempo, no Brasil, houve uma experiência na qual os pichadores são convidados a estilizar suas letras e queimá-las em cerâmica, para recuperar os muros do cemitério São Paulo, na Vila Madalena. A autorização para as intervenções não os afastou. Pelo contrário. Até ficaram satisfeitos em ver as letras ampliadas, muito visíveis e coloridas, como parte de uma grande instalação. Como estão feitos em cerâmica, aqueles desenhos deixam de ser passageiros. Ganham mais permanência. A transgressão no caso, soube encontrar um ponto de equilíbrio com a comunidade.
(*) Rubens Shirassu Jr. é designer gráfico e escritor
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