Rubens Shirassu Jr.*
Em 30/01/2011 às 13:09
Um dos grandes desafios brasileiros, no momento, é criar um modelo político urbano próprio, de tal forma que, nessa corrida em defesa do homem nos grandes centros, a cidade não chegue a esmagá-lo.
Presidente Prudente, como capital da Alta Sorocabana, é hoje uma das cidades interioranas mais bem arborizadas. Mas, onde paira a desconfiança do homem diante do outro, desconhecido, é a tônica mais visível e palpável nas relações sociais da população. À primeira vista, o entusiasmo diante da cidade, os transeuntes caminhando pelas avenidas cordiais e amenas. Tão amenas que os homens possam parar, olhar as vitrines, contemplar o céu e, finalmente, se reencontrar.
Interessa talvez lembrar que o maior espetáculo de uma cidade ainda é o homem. O maior acontecimento, ao longo de uma rua, avenida, precisa continuar sendo o homem. Em Curitiba, por exemplo, iniciou-se uma grande experiência urbanística, a partir do arquiteto Jaime Lerner, há dezesseis anos. O centro foi bloqueado aos carros. Uma imensa avenida central foi cedida ao homem, às bancas de jornais, aos cafés, às livrarias e lojas, e aos bares com mesas nas calçadas.
Velhos bondes parados, na rua das Flores – que mais parece um boulevard parisiense –, servem às crianças. Os pais, ao irem ao centro, têm onde deixá-las, no interior desses velhos e desativados veículos, que tão bem enriquecem a imaginação infantil. Qual a criança que não gosta de descobrir, com seu próprio corpinho, os estribos, os bancos, o corrimão, o comando de um bem cuidado bonde desativado? Uma orientadora toma conta dessas crianças, enquanto seus pais fazem compras, ou trabalham. E elas então brincam, desenham, correm, dançam, desenham, correm, dançam e aprendem. Saem de si.
Em termos de Brasil, as cidades estão sendo construídas e muitas vezes reconstruídas sem propósitos humanos, mas atendendo somente as exigências tecnológicas e imobiliárias. Não surpreende, portanto, o caráter desumano visível. Descompassadas em seu aspecto arquitetônico, poluídas, auditiva e visualmente enredadas em suas próprias contradições.
Será que um dia, firmaremos um pacto para evitar o risco de deteriorar o ambiente, em que se desenvolve a única coisa realmente insubstituível, que é a nossa vida? Há uma certa unanimidade entre urbanistas e arquitetos, de que em muitas regiões o Estado estrangulou a região metropolitana. Planejamento começa com a prática, e não com seminários, congressos, encontros que se prestam para viagens de recreio, mordomias e pouca ação concreta.
Quando em Curitiba se iniciou o fechamento de ruas aos automóveis, pareceu a muitos uma grande sandice. Pistas exclusivas para coletivos, também no início, foram vistas assim. É justo o automóvel ocupar 80% do trânsito das ruas de uma cidade, quando o coletivo é uma exigência social?
Quando o administrador entra no esquema do viaduto, do edifício-garagem, como solução ao transporte de massa, torna-se evidente que o homem foi derrotado pela máquina. As cidades são o que os administradores querem. Tendência não é destino. O município nessa luta contra a falta de um plano diretor, ou, planejamento urbano, tem que agir com urgência. Não é demais repetir: o maior espetáculo de uma rua ainda é o homem.
Vamos, portanto, revitalizar a área urbana. O melhor local para se morar numa cidade deveria ser o centro, e o é, nas metrópoles realmente civilizadas. Nele estão todos os serviços, e por um preço invariavelmente menor.
A reciclagem dos edifícios torna-se uma exigência. Principalmente, os velhos prédios. Nunca derrubá-los. Se eles se esgotaram numa função, cabe ao urbanista buscar-lhes nova utilidade. Os prédios antigos são bonitos e humanos, o que não ocorre sempre com os novos. Devolver o centro ao homem, de tal forma que ele se volte a caminhar, ou, dirija pelas ruas com maior espaço para estacionar, evitando assim o inchaço e o engavetamento no eixo central. O exemplo de Curitiba precisa se reproduzir em nome do homem.
Rubens Shirassu Jr. é designer gráfico e escritor